sábado, 1 de maio de 2010

Iniciativa 3D&T - Seja uma Divindade



Há muitas maneiras diferentes pelas quais é possível conceber as divindades e sua relação com o mundo, com seus devotos e com as outras divindades. Como tudo isso depende do cenário em questão, tentaremos apresentar aqui mecânicas que se adaptem à maioria de concepções possíveis, e com o mínimo possível de variantes. Além disso, a criação de personagens em uma campanha de personagens-deuses é necessariamente um trabalho em grupo e totalmente integrado ao cenário, e a interpretação dos mesmos é muito mais complexa do que a de personagens normais, então pode ser um pouco difícil jogar com deuses em uma mesa de iniciantes (e também seria muita apelação, né?).


Primeiramente, no cenário em questão, o que são as divindades e como elas surgem?
  • Deuses Maiores: Elas são entidades extraplanares, criadoras do mundo e das raças que o povoam, além de tudo mais que existe (a não ser, talvez, o universo em si). Criam seres e planos, conferem poder a sacerdotes, comunicam-se diretamente e/ou manifestam avatares. Elas foram, portanto, criadas por uma entidade transcendental (talvez a que criou também o universo), ou surgiram do nada mesmo.
  • Deuses Menores: Elas são entidades extraplanares, que não criaram o mundo e talvez nem as raças, mas criam seres e planos, conferem poder a sacerdotes, comunicam-se diretamente e/ou manifestam avatares. Nesse caso, elas também podem ter sido criadas por uma entidade trascendental, surgiram naturalmente do mundo ou, caso não tenham criado nem as raças, podem ter sido criadas pelos próprios devotos.
  • Titãs: Elas são entidades materiais superiores às raças, podendo ser seus criadores, ancestrais ou indivíduos exemplares, ou podem ser apenas criaturas poderosas, que conferem poder a sacerdotes e comunicam-se diretamente.
Note que os nomes das categorias são apenas mecânicos e não descritivos. Apenas o cenário pode determinar que tipo de divindade existe, e se é possível a uma divindade mudar de categoria.
É preciso então determinar o poder da divindade. Para isso servem as escalas, e dependendo da categoria, algumas escalas são permitidas:
  • Sugoi (x10): titãs; deuses menores de pouco poder.
  • Kiodai (x100): titãs de grande poder; deuses menores.
  • Kami (x1.000): deuses menores de grande poder; deuses maiores.
  • Kami II (x10.000): deuses maiores de grande poder.
  • Kami III, Kami IV e assim em diante: deuses maiores de poder maior ainda!
Dependendo das características do cenário, portanto, as divindades podem aumentar seu poder, seja através de acúmulo de poder mágico, através de um deicídio (matando outra divindade!) ou angariando mais devotos, caso eles a tenham criado e/ou seu poder dependa deles. Essa possibilidade de deuses menores que são criados por seus devotos, e cujo poder aumenta conforme cresce o número de devotos é muito interessante, mas deve ser bem trabalhada pelo mestre. Apenas ele pode dizer quantos devotos são necessários para determinar a escala de poder de uma divindade. Por exemplo, num cenário mundial, talvez apenas uma pequena seita seria suficiente para criar uma divindade Sugoi, mas para que ela ascendesse a Kiodai seria necessário que uma metrópole inteira ou boa parte de uma raça a venerasse, e para Kami, um reino (importante) inteiro, ou a maior parte de uma raça.
Todas as escolhas na criação de uma divindade tem como requisito a definição muito clara do que é uma divindade no cenário, como é seu corpo (material, imaterial), onde ela vive, como ele percebe e influencia o mundo dos mortais, etc. Também é importante que o mestre dê bastante liberdade aos jogadores na criação de novas vantagens, magias, raças, criaturas, kits, etc. Novamente, mostra-se a necessidade de jogadores experientes e de muito bom-senso. Aproveite também para exercitar sua criatividade! Fuja dos clichês! Os deuses não vivem no mundo material, mas em um plano próprio – ou vivem todos num mesmo plano, convivendo numa sociedade de deuses? Os deuses são gigantescos, e suas batalhas estremecem a terra e causam tsunamis, portanto seus devotos se esforçam em mantê-los calmos? Se os mortais é que criam os deuses, eles não teriam como manifestar os poderes que os deuses lhes dão sem a ajuda deles (num cenário como esse, magos ou até mesmo psiônicos ateus combateriam clérigos)? As divindades são capazes de perceber todo o mundo, ou apenas o fazem através dos sentidos de seus devotos ou com os próprios sentidos? Qual o alcance de seus poderes? Algumas idéias podem advir do conto no fim deste post.

Determinar a natureza do corpo de uma divindade é um passo muito importante… Não seja modesto!

Construção da divindade

A divindade é então construída como se fosse um personagem normal (com pontuação determinada pelo mestre, tendo como base também quais vantagens devem ser adquiridas pela divindade), e a escolha das vantagens, desvantagens e vantagens únicas determina os “domínios” da divindade. No caso das vantagens únicas, por exemplo, escolher Elfo a tornaria a divindade dos elfos (caso seja a principal) ou a divindade que dominaria algum aspecto específico da raça élfica: comprando a vantagem magia elemental, ela se tornaria a divindade da magia élfica; escolhendo espada ou arco como arma preferencial, ela se tornaria a divindade dos espadachins ou arqueiros elfos, etc. Seria interessante se o mestre autorizasse que, em vantagens únicas menos customizáveis, fosse possível ampliar certas habilidades com o gasto de pontos.
Aqui entra uma parte interessante do trabalho de criação de uma divindade – a interpretação das vantagens e desvantagens em relação ao domínio da divindade. Um deus das viagens, por exemplo, possuiria Aceleração e Sobrevivência; um deus da guerra, Ataque Múltiplo, Arma Especial, Adaptador; um deus da paz, Aparência Inofensiva e Magia Branca… Pensemos então acerca de algumas vantagens e desvantagens que trariam dúvidas:
  • Aliado: é construído numa escala abaixo, e geralmente será o sumo-sacerdote ou paladino máximo (ou seja, o devoto mais confiável), deus inferior ou criatura de grande poder que lhe serve. Não é permitido ter aliados mais poderosos, mas é permitido ter um número maior de aliados menos poderosos – por exemplo, uma divindade Kami pode ter um aliado Kiodai, 10 aliados Sugoi ou 100 aliados Ningen a cada vez que compra a vantagem.
  • Aparência Inofensiva: um pouco mais sutil – todos acreditam que a divindade é bondosa, fraca, etc. É muito importante em cenários onde a influência da religião é decisiva, pois ações desta divindade em geral parecem despretensiosas.
  • Arena: possuir uma arena pode significar que o deus tem aquele tipo de terreno sob seu domínio (por exemplo, o deus dos mares teria Arena: mares e oceanos). Dependendo do tipo de deus e do cenário, pode ser um requisito que toda divindade tenha uma arena, um plano-morada.
  • Clericato: em geral, todas possuem!
  • Familiar: toda uma espécie de criaturas são seus familiares, servindo como seus olhos e ouvidos. A cada escala, multiplique também o número de familiares. Cada divindade pode criar a espécie que quiser, mas gastando no máximo 3 pontos.
  • Forma Alternativa: proibida para deuses maiores ou deuses menores, e talvez para titãs, mas em geral é possuída por avatares.
  • Paladino: possuída apenas por divindades boas, e somente essas também podem ter paladinos.
  • Possessão: uma divindade poderia possuir um corpo mortal, mas isso pode deixá-la vulnerável, podendo ser morta (a critério do mestre).
  • Riqueza: isso pode significar que a divindade possui uma igreja, ou seja, uma organização que possui riquezas e que organiza o culto ao deus. Patrono também pode ser modificada para significar que há uma organização sob o personagem, organizando seus devotos – ou seja, a igreja.
  • Telepatia: em geral, deuses maiores e deuses menores a possuem, mas apenas para ser utlizada (sem gasto de PMs) em relação a seus devotos.
  • Torcida: não pode ser adquirida, pois todas as divindades têm devotos, e recebem os benefícios desta vantagem sempre que tiverem superioridade numérica de devotos e que estes estejam depositando sua fé em determinada ação. Por exemplo, se dois deuses maiores travam um combate de forças para determinar quem afetará o clima de uma região, terá um bônus de +1 aquele que tiver mais devotos rezando para que chova ou faça sol.
  • Ambiente Especial: em alguns cenários, deuses maiores ou menores podem ter esta desvantagem como obrigatória, em relação a seu plano-morada. O enfraquecimento e transformação em humano normal pode até mesmo ser irreversível!
  • Má Fama: indispensável para divindades malignas!
Além dessas vantagens e desvantagens citadas, outras seriam simplesmente inúteis ou inaplicáveis dependendo de como são as divindades do cenário. As vantagens que se aplicam estritamente ao corpo físico, por exemplo, em geral não são aplicáveis a deuses maiores e menores, embora o sejam a seus avatares. O mestre deve determinar quais vantagens e desvantagens devem ser possuídas por qualquer divindade (como clericato).
Toda divindade também deve ter à sua disposição uma certa (grande) quantidade de Pontos de Experiência, usados para comprar magias, tesouros, objetos mágicos, além de ser usada em campanha para obter sucessos automáticos, tornar possível o impossível, etc. Magias devem poder ser adquiridas apenas com PEs. O mestre deve, contudo, limitar as escolhas caso ache necessário.
Acompanhemos então um exemplo: num cenário onde divindades são criadas pelos devotos, sendo assim deuses menores, o mestre decide que todos os jogadores interpretarão os deuses da raça anã, que criou seu panteão por meio de histórias orais. Primeiro, todos os jogadores aplicam a seus deuses (da escala Kiodai) a vantagem única em questão, e se especializam em aspectos da raça. O mestre diz que nesse cenário, cada raça criou seu panteão, e os deuses vivem em locais míticos (planos com entradas pelo mundo, mas muito difíceis de se alcançar), cada panteão num plano, com uma região específica para cada deus. Um determinado jogador será o deus da guerra dos anões, e por isso ele escolhe ampliar a habilidade natural dos anões contra seus inimigos, e o mestre o autoriza a gastar 1 ponto para aumentar o bônus para H+3 contra os inimigos raciais. O mestre diz que cada deus será construído com 12 pontos mais 240 PEs, sem contar as vantagens exigidas (Arena, Clericato). O deus da guerra dos anões fica assim:
Uhr, Deus da Guerra dos Anões
Escala: Kiodai (x100)
F 4 (+2 machado mágico Baruk-Kazad)
2
3
0 (+2 armadura mágica Gerak-Kazad)
PdF 2 (+2 besta mágica Trokath-Kazad)
PVs 25
PMs 15
PEs 10
Vantagens: Anão (Infravisão, Resistência à Magia, Testes de Resistência +1, H+3 contra orcs, goblinóides e trolls), Arena (Khazad-Dûn), Clericato, Pontos de Vida Extras.
Desvantagens: Código de Honra da Derrota.
Itens Mágicos: Baruk-Kazad (+3, Anti-inimigo), Gerak-Kazad (+3), Trokath-Kazad (+3, Anti-inimigo),
Observações: o bônus total contra os inimigos raciais é +5 (+3 da raça e +2 da vantagem anti-inimigo das armas, sem contar o bônus mágico delas).
Para finalizar o processo de criação da divindade, exagere no background. Escolha um nome, um título (deus disso, deusa daquilo), um símbolo, descreva a igreja, as ordens de paladinos / clérigos / cultistas / shamans / druidas / etc., a relação dos devotos com o deus, a relação do deus com os outros deuses, e tudo mais que você possa imaginar ser importante.

Não coloque todo o seu poder em combate! A não ser que você seja o Deus da Guerra, é claro!

Poderes exclusivos

Algumas coisas apenas as divindades serão capazes de fazer: criar semideuses, encarnar em avatares, conceder poderes a clérigos…
O avatar de uma divindade é igual à divindade, mas uma escala abaixo (ou mais escalas abaixo, se o mestre determinar). O cenário determina se o avatar é o próprio deus materializado ou uma criação separada dele e sob seu controle, se ele é imortal ou não, se ele na verdade encarna em um mortal, etc. A vantagem Forma alternativa é comum em avatares (portanto o mestre pode determinar que todo avatar tem uma ou mais formas alternativas). O mestre também pode usar a habilidade especial de Avatares descrita no Manual da Magia, a Aura Divina:
  • Aura Divina. Na presença de um avatar, todos os clérigos, paladinos e outros servos de seu respectivo deus recebem temporariamente +1 em Habilidade, Resistência e Armadura (mas apenas quando o avatar se revela abertamente). Por outro lado qualquer inimigo da divindade que o avatar representa com R2 ou menos ficará paralisado ou fugirá à simples visão do avatar, durante 1dx10 minutos. Criaturas acima de R2 podem fazer um teste de Resistência -2 para ignorar esse efeito.
Em forma de avatar é possível relacionar-se com um(a) mortal e criar um semideus. Um semi-deus pertence à mesma escala do avatar ou menor, o que o mestre determinar. Ele pertence necessariamente ao kit de clérigo ou paladino de seu ascendente divino (se houver) e à raça de seu ascendente mortal. Descendentes de semideuses não o são, mas podem nascer com poder divino (sendo assim clérigos ou paladinos).
Por fim, cada divindade pode, de acordo também com o cenário, possuir clérigos e/ou paladinos, cultistas, sacerdotes, shamans, druidas, magos devotos, guerreiros devotos, etc. O mestre deve autorizar qualquer kit criado pelo jogador e este deve ter relação com os poderes da divindade.

Magia

A magia pode ser, nas mãos de uma divindade poderosa, uma arma versátil e imprevisível. Se o mestre desejar (principalmente em se tratando de deuses maiores ou deuses menores), a divindade pode criar magias à vontade, consumindo uma certa quantidade de PMs e requerindo as escolas que o mestre determinar. Ao mesmo tempo, não é indicado ignorar as magias do Manual Alpha, mas modificá-las, ampliá-las ou dar a elas novos usos quando elas não são suficientes. Veja no exemplo de um combate de poder um exemplo de uso de uma magia de forma diferente.

Combates de poder

Combates de poder são conflitos entre duas ou mais divindades em circunstâncias nas quais elas não estão realmente combatendo, mas tendo um choque de poderes. Exemplo: duas divindades estão protegendo navios com seus devotos numa guerra naval. Num encontro entre dois navios inimigos importantes, ambas as divindades decidem que vão se utilizar do controle do clima, usando a magia Criar Vento para virar a embarcação inimiga. É claro que elas podem conseguir virar os navios usando essa magia, mas apenas uma delas pode conseguir. Cada divindade, então, joga um dado e soma a ele a Habilidade e um valor que o mestre achar cabível – nesse caso, a quantidade de PMs gastos na magia, mas poderia ser uma outra Característica qualquer em outro tipo de combate de poder (um 6 no dado é um acerto crítico, e dobra esse valor). Ao resultado soma-se, eventualmente, um bônus de uma vantagem (Arena, por exemplo) e um bônus de +1 para aquela divindade que tiver mais devotos orando para que ela seja bem sucedida (a vantagem Torcida modificada). Caso a escala das divindades seja igual, quem tirar o maior resultado vence, senão a multiplicação da escala deve ser levada em conta. Confuso? Continuando o exemplo:
Divindade X: gasta 3 PMs na magia Criar Vento, rola um dado e tira um 5. Sua Habilidade é 3. Resultado: 5 + 3 + 3 = 11.
Divindade Y: gasta 5 PMs na magia Criar Vento, rola um dado e tira um 2. Sua Habilidade é 2. Seus devotos no navio são os que estão rezando mais (+1). Resultado: 5 + 2 + 2 = 10.
A divindade X vence o combate por um ponto, conseguindo virar o barco inimigo, mas sem muito estrago. Caso a margem de sucesso tivesse sido maior, ela teria se saído melhor em virar o barco. Caso as escalas fossem diferentes, por exemplo, a divindade Y sendo de uma escala acima da divindade X, a divindade X teria que ter uma margem de sucesso maior que 10 para ser bem-sucedida.
Combates de poder podem ocorrer sempre que uma divindade tente ter o controle onde outra divindade já o possui, ou quando ambas tentam ter o controle ao mesmo tempo. Por exemplo, caso uma divindade tente afetar diretamente um devoto de outra divindade, caso essa esteja ciente, as divindades travam um combate de poder. Assim, não é tão fácil para as divindades afetarem os mortais, e em um cenário desse tipo, ser ateu é roubada!

BÔNUS ROUND!

Trago a vocês um conto escrito há muito tempo atrás, narrado por uma divindade daquele tipo que é criada pelos devotos.

O Despertar de um Deus

Finalmente, após o interminável sono, eu pude acordar. Quando todos os meus devotos foram mortos, há milhares de anos, eu caí nesse sono sem sonhos, mas agora despertei. Isso porque um mortal encontrou e leu o Tomo de Lemminkainen.
Eu nasci num passado distante, antes mesmo que o atual Arquideus nascesse. Fui um dos primeiros deuses de Iberah a nascerem, na verdade.
Nós, deuses de Iberah, somos criados pelos mortais. A imaginação dos homens, e sua necessidade de incumbir a criação e regência do mundo a um ser superior e imutável, é o que nos cria. Quando nascemos, estamos numa sala pequena, apenas com um trono e uma superfície refletora. Ao nos sentarmos no trono, vemos com os olhos do mortal que nos criou, e ouvimos com seus ouvidos. Se ele divulgar a outros mortais sua crença, poderemos então ver e ouvir o que vêem e ouvem também essas pessoas. A esses mortais damos o nome de devotos.
Sentados no trono, podemos ouvir, também, as preces e pedidos de nossos devotos. Sabemos, por instinto, que cada um de nós possui poderes únicos, que devem ser utilizados para guiar e auxiliar os mortais, mas também para castigá-los, caso seja necessário: Só assim eles aprendem.
Pela superfície refletora podemos ver Iberah, mas não o mundo todo: Apenas as regiões próximas aos nossos devotos é que podemos ver. Todo o resto é encoberto por nuvens densas e negras. Para ampliar essa visão, podemos também, com o nosso poder, criar animais, criaturas que serão nossos olhos, ouvidos e dedos em qualquer parte de Iberah.
O mortal que me criou vivia numa pequena comunidade tribal, onde hoje ficam as minas subterrâneas. Ele me criou como o deus da magia, denominação dada por ele à arte de controlar a mente por meio de rituais, para então poder usufruir de seu poder. Meu nome é Lemminkainen.
Ele divulgou sua crença à tribo, e demonstrando seu poder (na verdade, ele me pediu em suas preces que meu poder fosse mostrado aos outros, e eu o atendi), e então todos passaram a me venerar. A tribo ganhou poder, e utilizando a magia por mim concedida, conquistou outras tribos e expandiu a crença.
O número de devotos que eu possuía cresceu rapidamente, e assim também cresceram meus poderes e minhas responsabilidades. Para auxiliar os mortais, eu dei vida à minha primeira criação, feita à imagem da representação que eles faziam de mim: Os Couatls.
Quando meu poder já era grande e meus devotos conquistaram grande parte de Iberah, veio até meu cômodo outro deus. Eu sabia da existência de outros deuses pelos mortais, mas não que eles poderiam comunicar-se entre si. Ele pediu para entrar, e eu autorizei.
Era um ser poderoso, radiante. Dizia ser Erataoth, um dos três deuses supremos (naquele tempo, não existia somente um Arquideus, mas sim uma trindade deles), e me convidava a visitar seu plano, que era a sede da Sociedade Divina. Eu aceitei o convite, e o segui.
Viajamos pelo espaço por alguns segundos, até chegar em sua morada, um grande palácio de granito negro. Lá estavam outros deuses, e eu fui me lembrando deles conforme me eram apresentados, pelos relatos dos mortais: Tantabaoth e Sabaoth, os outros dois deuses supremos; Anu-Teah, a deusa do grande astro noturno; Entaorumn, o deus da terra e das árvores; Athi, o deus do conhecimento e da razão, entre outros.
Eles me disseram que, quando nascem, os deuses são chamados Entidades. Conforme seu poder cresce, tornam-se Divindades, e depois, Deuses Menores. O meu poder cresceu tão rapidamente que eu ascendi logo ao status de Deus Maior, antes que eles pudessem encontrar meu plano, minha morada. Por isso, eu deveria agora integrar a Sociedade Divina. Porém, acho que eu não tive a reação que eles imaginavam que eu teria. Eu disse que tal sociedade não me interessava. Interessava a mim apenas seguir auxiliando meus devotos com meu poder, para que eles pudessem viver com felicidade e força.
Os deuses se revoltaram, me chamaram de louco, traidor e outros insultos. Erataoth apenas me pediu para saísse.
Dali em diante, outros povos começaram a se levantar e atacar o vasto império que haviam formado meus devotos. Incumbi os sacerdotes (mortais que dedicam sua vida ao culto do deus) com maiores poderes para defender seu povo, mas não foi suficiente. Os outros deuses muito provavelmente haviam se juntado contra mim, e era difícil resistir ao seu poderio combinado.
Como os sacerdotes e as novas criaturas (os Dragões) não podiam defender o império de Lemminkainen com eficácia, meus devotos começaram a perder sua fé. Percebi que isso diminuía meu poder, e se continuasse levaria à minha ruína. Então, concentrei todo o meu poder, e encarnei. Tomei um corpo físico em Iberah.
Esse corpo tinha a forma que eu desejasse, e os mesmos poderes e percepção que eu tinha em meu plano. Algumas vezes eu surgia como um velho mago-sacerdote, ajudando o povo e fazendo sua fé crescer. Outras vezes, eu surgia como um dragão de grande poder e arrasava os exércitos inimigos. Mas enfim, percebendo que o povo precisava da figura de um herói e salvador, eu tomei a forma de um mortal jovem, de vestes simples, mas nem por isso menos poderoso. Fui até o povo e os incitei à luta. Comandei seus exércitos e instruí pessoalmente meu sumo-sacerdote. Fui à guerra.
Numa certa batalha eu lutava ao lado de mortais, Couatls e Dragões, contra mortais inimigos, serpentes venenosas e guerreiras-cobras traiçoeiras, quando encontrei outro ser muito poderoso. Logo percebi que se tratava de Athi, também encarnado em forma de Avatar.
Travamos um combate longo e sangrento. Minha espada espiritual muitas vezes o golpeou, assim como suas adagas retorcidas me golpearam. Mas no fim, fui eu que sucumbi, pois suas lâminas estavam embebidas num veneno letal.
Retornei então ao meu plano, mas vivi tempo suficiente apenas para ver meus devotos sucumbirem. Pouco tempo depois eu já estava adormecendo.
Porém, milhares de anos depois, um mortal encontrou as ruínas de um antigo templo, e nelas, tesouros incontáveis, e um livro. Escrito em língua antiga, esse era o Tomo de Lemminkainen, livro onde meus devotos registraram toda sua crença. O mortal então estudou por muito tempo, para poder decifrar a linguagem e compreender o Tomo.
Agora, com minha memória e crença reavivadas, eu poderia viver novamente para vingar-me de Athi e dos outros deuses que me destruíram, mas não os encontrei. Nenhum deles existia mais, e agora não eram três, mas apenas um Arquideus. E o pior eu descobriria a seguir: Sobre as cinzas de meu império foi construído outro, mas negro e perverso. E este ganhou poder ao distorcer e se aproveitar das mensagens deixadas por mim em minha vinda à Iberah.
Isto era mais importante que a vingança.

0 comentários:

Postar um comentário